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Ressurreição de espécies extintas: como lidar com esta realidade?

Se você é um daqueles fãs aficionados por Jurassic Park e ainda acredita, lá no fundo, que um dia poderá viver a experiência de compartilhar o Planeta com estas majestosas e temíveis criaturas, devo pedir desculpas por desapontá-lo.

Existem estimativas de que fragmentos de DNA íntegro não resistam mais que 6,8 milhões de anos. Se levarmos em consideração que os dinossauros foram extintos há aproximadamente 65 milhões de anos, no fim do período Cretáceo, as possibilidades de trazê-los de volta à vida parecem improváveis.

Mas não se desespere! Num futuro não tão distante, a ciência garante poder “ressuscitar” espécies extintas há menos tempo, como as pertencentes à megafauna, por exemplo, afinal elas desapareceram do planeta há apenas 20.000 anos.

“Por que?”, “Como” e “Será uma boa ideia?” podem ser algumas das perguntas passando pela sua cabeça neste momento. Esta temática é bastante delicada e por isso eu trouxe alguns pontos que são levados em conta pela ciência, e dilemas que surgem quando passamos a compreender melhor os benefícios e riscos da De-extinção. Cabe a você, caro leitor, inserir ambas as opções de cada dilema nos pratos de uma balança, avaliá-las sob olhar crítico, decidir qual prato pesa mais, e criar sua própria opinião sobre tudo isso!

Por que trazer à vida uma espécie já extinta? Não existem centenas de milhares de outras espécies animais? Por que estamos tão preocupados em ressuscitar esta ou aquela espécie?

Bem importante é entendermos que em momento algum a ideia é criar um zoológico, ou um parque com fins turísticos e econômicos. Todas as espécies, desde animais até vegetais, fungos e microrganismos, possuem funções ecológicas nos ecossistemas em que habitam. Algumas destas funções, como a polinização da flor de maracujá, por exemplo, podem ser desempenhadas por diferentes espécies de aves, morcegos e insetos. Outras, entretanto, são exercidas por uma ou duas espécies apenas, como no famoso caso da orquídea de Darwin (Angraecum sesquipedale), espécie endêmica de Madagascar polinizada pela mariposa-esfinge (Xanthopan morgani praedicta), que possui uma probóscide longa o suficiente para introduzir no canal de néctar da orquídea. Este é um exemplo clássico do que chamamos Co-evolução, quando duas ou mais espécies afetam a evolução uma da outra, devido às relações ecológicas íntimas entre elas. Ora, se são tão dependentes uma da outra, o que poderia acontecer se uma delas fosse suprimida do ambiente? Exatamente! O processo inverso, uma possível Co-extinção de ambas.

É evidente que em alguns casos uma outra espécie pode vir a ocupar o nicho deixado vago pela espécie extinta, e passar a exercer o papel dela no ecossistema. Portanto, tudo vai depender da complexidade das relações ecológicas entre as espécies deste ecossistema. Desta forma, uma das principais justificativas para trazer de volta uma espécie extinta é a de recuperar funções ecológicas que foram perdidas e não mais desempenhadas por qualquer outra espécie. Duas espécies que se encaixam nesta justificativa são o mamute-lanoso e o pombo passageiro.

O mamute, juntamente com outros grandes herbívoros, mantinha a vegetação de campos na região de tundra, derrubando árvores e espalhando sementes. Quando desapareceram deste ecossistema, a tundra musgosa passou a cobrir o solo, e hoje, a medida que vem derretendo, contribui grandemente com a liberação de dióxido de carbono e consequente aumento da temperatura no globo. A de-extinção dos mamutes representaria, segundo a ciência, a possibilidade de recuperação dos ambientes de pastagens e desaceleração do aquecimento. No caso do pombo-passageiro, este parecia ser uma das espécies chave na dispersão de sementes do carvalho branco, que teve suas populações reduzidas quando o pássaro foi declarado extinto. Funções ecológicas únicas! É esta a resposta para o “Por quê?”.

Mas Como isto pode ser feito? Primeiro, podemos encontrar espécies vivas que se assemelham às espécies extintas e criá-las de forma seletiva, selecionando características de interesse. Por exemplo, elefantes com uma quantia maior de pelos no corpo. Esta técnica não é bem considerada uma de-extinção, mas as funções ecológicas podem ser substituídas quanto mais semelhante a espécie viva se tornar da extinta. Outra alternativa é o uso de clonagem, onde uma célula somática do animal extinto teria seu núcleo retirado e inserido em um oócito de um animal vivente muito próximo. Contudo, permanece restrita para espécies extintas recentemente, visto que os núcleos das células precisam estar íntegros. Por fim, a engenharia genética e seus espetaculares avanços também poderiam contribuir para este fim.

O chamado sistema CRISPR-Cas9 vem sendo amplamente utilizado na retirada e inserção de fragmentos específicos de DNA, de genes de relevância da espécie extinta para a vivente. Aqui nós temos uma versão moderna de um animal, modificado para parecer com seu parente extinto, e podendo portanto, cumprir o papel ecológico dele no ambiente.

A resposta para “Será uma boa ideia?” é um pouco mais complexa. Não podemos ter certeza. Apenas supor. Devemos nos lembrar que os ecossistemas não são estáticos e continuaram a sofrer alterações após a extinção de cada espécie da qual temos conhecimento. Elas conseguiriam se adaptar a estas mudanças? As reintroduções seriam bem-sucedidas? E os fatores que as levaram à extinção de fato? Como podemos garantir que a história não se repetirá? Ainda, será que não perderíamos a noção do quão grave é a extinção de uma espécie e de como isto afeta o equilíbrio de todo um ecossistema e a nossa consequente permanência no Planeta? Por que nos preocuparíamos com a redução das populações de leopardos de Amur na Rússia, guepardos em Israel e linces ibéricos se, caso extintos, dispomos de tecnologia e cientistas capazes de recuperá-los? E os custos disso tudo? São extremamente altos, disto podemos ter certeza. Quem é responsável por isso? Se agências particulares se dispõem a assumir os custos, não poderiam estar redirecionando verbas inicialmente conduzidas para programas de conservação de espécies viventes extremamente ameaçadas, como o elefante africano, por exemplo, para as pesquisas e técnicas de de-extinção de outras espécies?

A lista de impasses, com prós e contras, é bem mais extensa. É imprescindível compreendermos que a extinção é um processo natural no Planeta e que cinco extinções massivas já dizimaram uma infinidade de espécies que aqui viveram. Mas estamos caminhando para uma sexta extinção. Isto é fato e do conhecimento da maioria. Mas trata-se de uma extinção inédita no sentido de que o fator desencadeante é diferente daquele responsável pelas anteriores. Nós somos os protagonistas da Sexta Extinção.

Dispomos de tecnologia adequada e pesquisadores comprometidos a trazer espécies de volta à vida, se for preciso. Mas fazer o que for necessário no sentido de evitar que elas entrem para este hall da extinção não parece uma decisão mais ajustada e urgente?

Se você ficou intrigado sobre como e onde temos material genético conservado de espécies extintas e mesmo daquelas em vias de extinção, prometo contar na próxima!

Bennett, Joseph R. et al. Spending limited resources on de-extinction could lead to net biodiversity loss. Nature Ecology & Evolution, vol. 1, 0053, p. 1-4, 2017. DOI: 10.1038/s41559-016-0053.

Quill, Elizabeth. These are extinct animals we can, and should, resurrect. Disponível em <https://www.smithsonianmag.com/science-nature/these-are-extinct-animals-we-can-should-resurrect-180954955/>.

Schultz, David. Should we bring extinct species back from the dead? Disponível em <http://www.sciencemag.org/news/2016/09/should-we-bring-extinct-species-back-dead>.

Zielinski, Sarah. De-extinct probably isn’t worth it. Disponível em <https://www.sciencenews.org/blog/wild-things/de-extinction-probably-isnt-worth-it>.

Laís Grossel
Laís Grossel
Bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade do Contestado (Mafra, SC) e Mestranda em Zoologia pela Universidade Federal do Paraná, onde trabalha com Reprodução de Animais Silvestres. Tem interesse em pesquisas que investigam aspectos biológicos e ecológicos de vertebrados de forma geral e que possam ser revertidas de forma prática na conservação das espécies.
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